Remar rio acima...
Toda caminhada começa com um passo, mas um passo não é toda a caminhada. Se queremos ir além, ir mais longe, precisamos continuar caminhando. Iniciaremos um caminho que conterá muitos passos, muitas remadas para o barquinho subir o rio... Você topa???
NEUROCIÊNCIA E COMPORTAMENTO


Por que fazemos isso? As razões, ainda que pudéssemos elencá-las, podem ser explicações que não nos tirariam de um funcionamento danoso. Pensemos. Quando somos crianças (bebês mesmo) deparamo-nos com a inescapável (na melhor das hipóteses) situação de constituirmo-nos como sujeitos (nos dois sentidos da palavra). Estamos imersos em um ambiente que fala por, para, de nós e, com sorte, conosco. Quem somos é um emaranhado de circunstâncias, interpretações, acontecimentos, falas e tudo o mais que nos envolve de alguma forma.
Nesse eterno “quem sou eu”, imitamos, copiamos, montamos, inventamos um ideal de eu (ver artigo “Quem sou eu?”) que rejeita aspectos, vontades, propósitos que nem sabemos conscientemente que temos, mas acreditamos (de forma não tão consciente) que se pudéssemos ser de outra forma (como nós mesmos), isso chocaria com aquele ideal fantástico de perfeição, de bondade, de sucesso, de inteligência e outras tantas qualidades absolutas que ninguém tem, mas que idealizamos como sendo aquilo que esperam de nós, aquilo que, definitivamente, fará com que todos (eu disse todos) nos amem incondicionalmente (ou não tão incondicional assim). Com isso, construímos crenças sobre nós mesmos, lançamos mão de defesas que nos protegem do desfacelamento... E, quanto mais precisamos nos proteger (por razões reais ou imaginárias), mais nos distanciamos de nós mesmos. Já não somos tão hábeis em saber o que queremos realmente. Quanto mais idealizados nos projetamos, mais nos sentimos fracassados, mais nos sentimos como uma fraude. Mais colocamos “cascas de bananas” em nosso caminho para confirmar aquilo que sabemos sobre nós: não sou aquilo tudo que digo e enceno ser. Vão me descobrir. Mais organizamos a nossa realidade para sermos “desmascarados”.
E isso se manifesta de inúmeras formas. Quando estamos à procura de um emprego, por exemplo, podemos nos convencer que trabalhar é exatamente o que desejamos. Estamos tão convictos disso que somos capazes de ficar aborrecidos quando não conseguimos aquela vaga dos “sonhos”. Ou quando encontramo-nos em uma posição (emprego, namoro, casamento, sociedade, etc) teoricamente boa, mas não nos achamos exatamente merecedores, temos diversas atitudes que vão se escalonando: palavras mal colocadas, atrasos dos mais diversas tipos, atos contrário àquilo que deveríamos fazer, atitudes passivo-agressivas que vão minando as relações, culminando em uma descida ladeira abaixo que leva à confirmação das nossas crenças de fracasso e inaptidão.
Por não perceber que o que realmente desejamos, organizamos a realidade externa para não conseguir (ou destruir) o que dissemos para nós mesmos que queríamos muito... Autossabotagem, dirão alguns. Não concordo. Sabotar aquilo que dissemos que queríamos quando é contrário àquilo que de fato queremos não é de fato sabotagem, mas êxito. Pasmem: nossa vida está exatamente como gostaríamos que ela estivesse. E, se ela não está lá grande coisa, deveríamos perguntar: por que a quero assim? Por que me sentir fracassado ou miserável é tão importante? Por que escondo de mim aquilo que realmente quero?
Resposta simples: ter consciência da responsabilidade pelos próprios desejos, sentimentos e comportamentos pode ser doloroso. Preferimos atribuir a “culpa” a um outro. Ter em mente que fizemos tudo o que podíamos é reconfortador. Como abrir mão daquele nosso eu tão maravilhoso, onipotente, perfeito? Se não sou aquilo tudo, então sou nada??? Como nos contentar em sermos apenas... pessoas?
(Continua...)




